Os senhorios que nunca declararam os contratos de arrendamento e os respectivos rendimentos às Finanças e que quiseremrecorrer ao despejo simplificado previsto na nova Lei das Rendas, terão de passar a declarar os contratos e regularizar asituação, o que lhes pode valer uma multa das Finanças pelos anos de incumprimento.
A proposta de Lei do Governo,que se encontra na Assembleia da República, estipula que, «para combater a informalidade e a economia paralela (...) os contratosde arrendamento relativamente aos quais o senhorio se pretenda prevalecer deste mecanismo (despejo facilitado) têm de estarregistados junto da administração fiscal, bem como cumpridas todas as obrigações tributárias relativas aos mesmos».
Ouseja, se os contratos não estiverem registados, e o senhorio quiser recorrer ao despejo previsto na nova Lei, este vai terde o registar. O problema é que, se as rendas não tiverem sido declaradas e o respectivo imposto pago, o senhorio é «apanhado»a fugir ao Fisco, e pode ser multado.
Evasão é frequente neste mercadoPara Maria José Santana, advogadada Sociedade Rebelo de Sousa Advogados, esta regra pode deixar de fora a maioria dos senhorios. «Estamos a falar de contratosantigos (anteriores a 1990). Muitos têm décadas e já ninguém sabe onde estão, outros nem existem, não há nada escrito, é tudoverbal. E durante décadas era normal as pessoas não declararem e não pagarem os impostos relativos a estas coisas, não haviacontrolo, nem retenão na fonte, também porque não havia incentivo, nem para os senhorios nem para os inquilinos, à declaraçãodos contratos, e por isso é um mercado em que sempre houve muita evasão».
Questionada se estes senhorios, caso agoradecidam registar os contratos e forem apanhados a fugir ao Fisco nos últimos anos, podem ser multados, a advogada responde:«Eventualmente sim».
As dívidas fiscais prescrevem ao fim de dez anos. Por isso, se o senhorio tentar agora registaro contrato e, nas suas últimas declarações de rendimento não constarem as rendas, pode ser «apanhado» a fugir ao Fisco nosúltimos 10 anos.
Muitos senhorios podem desistir dos despejos«Dependendo do valor da multa e dasrendas, pode-se cair no ridículo de não compensar registar o contrato e proceder ao despejo. Isso pode funcionar como um desincentivopara a transição para o novo regime», defende Maria José Santana.
Ou seja, «pode-se repetir o mesmo problema da últimaLei. Na Lei anterior, os senhorios não actualizavam as rendas porque estavam obrigados a fazer obras e já sabiam que não compensava.Gastavam mais nas obras do que ganhavam com o aumento das rendas. Por isso muitos desistiram», diz.
A advogada consideraesta obrigatoriedade de declaração dos contratos de arrendamento como uma «tentativa de moralização. O Governo não quer sóimpor sacrifícios, que são tão pesados, aos portugueses. Quer também dar um sinal de moralização dos costumes. Dá este direitoao senhorio (de despejar mais facilmente), mas castiga os que tentam evadir-se das suas obrigações fiscais».
Partefiscal é o ponto mais frágil da LeiPor tudo isto, e embora considere a nova Lei «arrojada», tem dúvidas se amesma terá «pernas para andar». «O ponto mais frágil desta Lei é precisamente a parte fiscal».
«Será certamente umaLei polémica, mas vamos ver se, na prática, funciona. Por que a prática é tão ou mais importante que a redacção da Lei. Vamosver se o balcão único funciona, quem vai fiscalizar estas coisas e se essa fiscalização é bem feita...», sublinha.
Anova Lei dificulta também a «herança de contratos e limita a
transmissãoa apenas dois anos. Os inquilinos que aleguem baixos rendimentos terão de fazer
prova de rendimentos anual junto do senhorio.
Fonte: Agência Financeira