Os avaliadores de imóveis poderão estar a ser «chantageados» pelos serviços das Finanças para fazer o seu trabalho, sobpena de serem exonerados. Os presidentes das ordens dos engenheiros e dos arquitetos afirmaram esta quarta-feira ter recebidotestemunhos nesse sentido.
«Temos informações desse tipo.
Eu compreenderia essa atitude no Estado Novo, não depoisdo 25 de Abril. São informações que não podemos confirmar, mas que, se nos são transmitidas, acreditamos no que nos estãoa dizer», disse à Lusa o bastonário da Ordem dos Engenheiros, Carlos Matias Ramos.
Também o presidente da Ordem dosArquitetos, João Belo Rodeia, referiu testemunhos de avaliadores que dizem estar a ser contactados para fazerem avaliaçõessob pena de serem substituídos.
As afirmações foram feitas após uma reunião com o secretário de Estado dos AssuntosFiscais, Paulo Núncio, cuja posição foi considerada pelos responsáveis como «irredutível» quanto à alteração das remuneraçõespagas pela avaliação fiscal dos imóveis.
Perante os valores que variam entre 91 cêntimos e 5,5 euros fixados em fevereiro,a contestação tem sido generalizada entre as duas ordens, associações e sindicatos e peritos de vários distritos do país decidiram
suspender a sua atividade.
Segundo informações recolhidas pela Lusa junto de profissionaisdo setor, peritos do distrito de Setúbal foram contactados telefonicamente na tarde de terça-feira e «chantageados» para queaté à noite submetessem avaliações, «sob pena de serem exonerados».
No documento denominado
termo de posseque cada perito local de avaliação geral de imóveis assina está já prevista sua substituição imediata se não cumprir o númeromédio de avaliações que é acordado.
Os peritos assinam um documento em que se lê que o profissional se «comprometea efetuar em termos médios o número mínimo de avaliações diárias de (espaço para preencher) sob pena de poder ser substituído(a) de imediato nas suas funções por este motivo, se o mesmo lhe for imputável».
O responsável da Ordem dos Engenheiroscriticou este texto e referiu ter recebido «pelo menos com grande espanto» este
termo de posse porque o Estado «é umapessoa de bem e devia ter comportamentos de pessoa de bem».
«Ao ler este
termo de posse fiquei com os poucoscabelos em pé, o que é difícil, porque quase não os tenho».
Carlos Matias Ramos lembrou que os «peritos não são funcionáriospúblicos» e criticou o compromisso que têm de assinar no pressuposto de que «se não fizer, vai para a rua».
As críticasforam partilhadas pelo responsável da Ordem dos Arquitetos, que acrescentou que na reunião desta manhã no Ministério das Finançaso secretário de Estado «não tinha margem de manobra para negociar».
João Belo Rodeia esperava compreensão pela parteda tutela, mas, segundo o presidente da ordem, argumentou que os pagamentos não eram alterados devido à crise vivida no país.
«Estamossolidários com o esforço que se deve fazer, mas tal não pode ser argumento ou pretexto para a degradação das condições detrabalho das nossas profissões».
Questionado sobre se será cumprida a meta de avaliação de cinco milhões de imóveisaté ao final do ano, medida inscrita no memorando da troika, o presidente da Ordem dos Arquitetos referiu que só mais tardese saberá.
«Mas é o próprio Estado que está a pôr areia num caminho que devia ser trilhado com dignidade. O Estadoestá simultaneamente a exigir e a retirar as condições apropriadas» para os avaliadores exercerem o seu trabalho, considerou.
Osdois dirigentes vão continuar a analisar a situação e prometeram tomar uma posição conjunta a anunciar mais tarde.
Fonte: Agência Financeira